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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

O preconceito dos olhos de quem vê.

Por Marcos Araújo

Ama ao próximo como a ti mesmo, assim reza a máxima cristã impregnada pelo cristianismo imanente da cultura ocidental ora celebrada. É o expoente mais tangível da nossa hipocrisia hedionda, da nossa falácia cruel travestida de educação, do nosso esforço pueril em construir verdades, bondades e sorrisos de papel, facilmente alvejados por qualquer gota de chuva, qualquer ventania que reverbere ao público nossa Síndrome de Poliana, nossa esquizofrenia moral, no entanto, Jane Elliot, a saber, com muito destemor, recria essa máxima no documentário “The Eye of the Storm” à luz da bioquice mastodôntica da segregação racial sustentada nos Estados Unidos da América.
Qual diferença você enxerga?
Uma experiência construída na sala de aula, palco do controle social, deu ênfase para o exercício do altruísmo. Crianças da 3ª série eram dividas em grupos de acordo com a cor dos olhos, as crianças de olhos castanhos usariam colares verdes para se distinguirem, o colar representava a sua condição de inferioridade diante das crianças de olhos azuis, elas não poderiam brincar com elas, não dividiriam a merenda, sequer poderiam usar o mesmo bebedouro, do contrário, as crianças de olhos castanhos matariam a sede tão somente num copo de papel. Crianças de olhos azuis não precisavam de colares, representariam espécies superiores, perspicazes, inteligentes, dignos de encômios e livres de riscos.
A tensão psicológica criada na representação de cada criança recriava o cotidiano de um negro, por óbvio, crianças de olhos castanhos experimentariam amargamente dos desdobramentos da segregação e sobre eles fariam juízos de valor, por outro lado, crianças de olhos azuis sabiam que as outras crianças eram absolutamente iguais a elas, mas o colar e a cor dos olhos estabeleciam um critério de diferenciação que não era suficiente para a construção das barreiras sociais ora impostas.
O experimento aplicado nessa turma por Jane Elliot, socióloga e professora, repercutiu sobre os aspectos mais variados de sua vida. Uma sociedade racista não admite confronto, não admite mudanças que afastem o pragmatismo primeiro da superposição das raças, o homem branco americano não queria perder o domínio para o homem negro, tal como o brasileiro ainda persiste na ideia que reconhece um Brasil equânime, despido de discriminação e/ou preconceito, sublinhe-se, o homem brasileiro das elites. Elliot promoveu o confronto com a mesma base epistemológica utilizada por Hitler para definir quais judeus deveriam ser executados na câmara de gás (de preferência os que tinham olhos com cores escuras); todavia, a ideia revestiu-se de modificações salutares e uteis para que se chegasse a conclusões frutíferas.
Jane Elliot, professora e socióloga
Quando o exercício promovido pela socióloga é levado para um workshop gravado livre e espontaneamente por americanos e utilizando das mesmas técnicas, contudo, invertendo as posições das pessoas de olhos castanhos e azuis, sendo que, estas estariam em desvantagem, o resultado resta inequívoco, promove exatamente os mesmos efeitos. As pessoas de olhos azuis são capazes de perceber que o mal que sobre elas se assenta em duas horas e trinta minutos é o simulacro da situação fática que envolve todas as minorias que as cercam por toda a vida, por toda a existência miserável desses seres humanos. É curioso perceber que a omissão de cada uma delas é a própria anuência; e, o primeiro passo para a reafirmação do preconceito, da agressão injustificada, do apartheid social.
As elucubrações de Jane Elliot trazem à baila sua paixão candente pelo homem e sua luta diária para com a justiça, a igualdade e a dignidade de todo ser humano. É um documentário que não se arraiga às amarras do tempo, pois que a diferenciação da raça humana e seus consectários se avultam na história desde os primórdios da humanidade. Não se deixa de assistir The Eye of the Storm, é uma ordem.


Documentário disponível em:   The Eye of the Storm - Legendado - Avi. 

Documentário disponível no YOUTUBE. 

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