Não vê a menina suja pedindo
trocado no sinal, não vê a mosca solta sobre a ferida alheia, não vê o que
despenteia, nem o que mata, que dirá o que estraga a família inteira, não vê o
morto de fome, nem o morto-sem-nome, se esbarra e não pede desculpa, não vê boa
conduta, nem ama de igual pra igual, vê teu sexo e com quem se deita, qual laço
se enfraquece, mas quem adoece só é visto no Final. Não vê o que nos cala e
incendeia, ignora quando a brisa é farta e a clareira dos céus sobre o mundo.
Não vê Maria ou João sem sobrenome, nem a truculenta solidão que consome, não
vê nada além do olho roto que mira a TV feito esgoto afogando e afagando, e informa quão raro é quem olha, quão
escasso quem enxerga. Não vê coisa séria se tudo é estupidez, ignora sensatez,
e zomba do policial parado na esquina esperando a morte chegar feito bailarina
girando com sua sorte. Não vê quem mata sem faca, e escolhe não perceber pequenas chacinas contidas no
nababo escroto/deputado federal apontando sua arma de lá do Congresso. Candelárias, Realengos, Pinheirinhos: Não vê.
Quem viu? Não aguento.
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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013
A festa de Momo tem cor?
No primeiro dia de carnaval ouvi
algo que me chamou atenção, se trata daquelas coisas que a gente escuta
aleatoriamente e não sai de forma alguma da nossa cabeça. Pois bem. Detesto
discursos tendentes a generalizar a homofobia, o racismo, a xenofobia, pois que
me parece moda encalacrar todos os males do mundo nessas legendas, mas ouvi com
estranheza na quinta feira passada uma jovem branca de classe média alta dizer
que o mentor de “Gangnan Style” só
estava chamando tanta atenção pelas ruas soteropolitanas por conta da
aparência, mas o Presidente dos Estados Unidos, sua mulher e filhos, poderiam
vir tranquilamente e ficar no meio do povo, todos pensariam que a família Obama
estaria camuflada vendendo cerveja no isopor.
Não compreendi, ser preto é
pré-requisito pra vender cerveja na rua? Curioso foi vivenciar por três vezes
em ocasiões distintas durante a folia a confusão que transeuntes faziam ao me
confundir com um vendedor de cerveja, naturalmente, essas pessoas lançavam um
olhar apressado, pediam as populares 3“periguetes” por cinco reais (pequenas
latas de cerveja), estendiam o dinheiro, e como a situação seguia com o meu
silêncio, se fazia o constrangimento no ar, portanto saíam em silêncio e
fingiam que aquilo não havia acontecido. Ao relatar o acontecimento numa das
minhas redes sociais um amigo fez o seguinte comentário: “Sou o preto que supervisiona uma equipe de 18 pessoas num hospital de
grande porte, mas quando vou à padaria, sou atendente, numa loja, sou
atendente, nunca no caixa, jamais cliente”. Não preciso da luz de um gênio
pra notar que é assim comigo também.
Duvido que haja quem creia que
quem passa todo o carnaval dormindo nas calçadas dos Circuitos Dodô e Osmar esteja
feliz (não raro famílias inteiras), onde a gente pisa, pula, e cospe, por onde
o povo urina; lá muita gente vê o trio elétrico passar enquanto vende cerveja,
cachorro quente, espetinho de churrasco etc. Ainda assim, não derramo uma gota
da dignidade desse labor, e creio mesmo que apesar da miséria, se trata de
dinheiro honesto, certo que a assertiva já é clichê – diga-se de passagem, um dos melhores – se é vergonhoso vender
cerveja na rua, o que diremos de quem sai de casa disposto a enfiar uma faca na
sua cintura e levar seu dinheiro, seu celular e/ou sua vida? Não sei se meu
medo de entrar numa grande neurose com questões de raça, gênero, regionalismos,
pode ser maior do que as dúvidas que vieram à tona: um preto perto de um isopor
na festa momesca só pode ser vendedor? E no camarote, é o garçom ou o
segurança? Em cima de um trio, o que eu seria? A coincidência bateu na minha
porta três vezes ou se trata de um gérmen asqueroso guardado na consciência coletiva
da nossa sociedade?
Gostaria humildemente de
responder essas questões com equilíbrio necessário para pensá-las sem quaisquer
vícios, com mais delicadeza e neutralidade, se possível for. Entretanto, só há
uma dúvida que não me comunica, pois que nem poderia me pertencer: já me sinto
da família Obama.
Por Marcos Araújo
domingo, 10 de fevereiro de 2013
02/13
Não houve outro tempo pra mim que aproximou tanto a tênue
linha que existe entre os sentimentos, todos eles, dos que se reprimem no
coração aos que perpassam os lábios, as mãos, os braços que se cruzam; e, ainda
que se trate de covardia, que boa era aquela época que acreditava na promessa
do desenho animado me informando que se existe bem e mal nesse mundo, coexistem
em universos distintos, cada qual com suas peculiaridades. Não era verdade, descobri
que esse maniqueísmo inventado só nos inspira a sofrer menos, enxergar
as desgraças da vida com menos tristeza. Apesar disso tudo, e de nem me
considerar homem feito ainda, não sou uma pessoa má, nem como se diria nesse
mundo nem o seria num desenho. Falível que sou, passível de erro, de cair
doente, de chorar vendo filme, de me distrair ouvindo música boa, de amar, de
amor, não sou uma pessoa má. Sou gente de verdade.
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