Seguidores

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Chance.

Garoto, existir é o que há de mais pesado, mas sagrada é a vida que nos faz corar. Se tu foste um exímio predicado de fatos tão destrutivos, tão cegos, iludindo-se no falso esmero dos vícios e imensidões, se teu prazer lascivo manchou teu coração agora edipiano, e se o sopro da vida por pouco lhe esvaiu. Vê só, olha onde estais!


"Aprende a viver como deves, e saberás morrer bem"
  Confúcio

És o que um velho amigo diria: malandro, sortudo e até mais. Pois digo que são seus pretextos, seus toques a virar-me ao avesso, a que chamo nas noites que a vida parece curtir um brilho em minha’lma, que não te permite partir. Acrescento assim, menino, vê quão grande é a história que há de ser escrita, e toma cuidado dos seus dias, das suas horas e dos segundos da tua vida.


E o tempo sai levando consigo, meu bem, o soprar da ventania desse Universo desbotado, pintado nas paredes dessa sua cabecinha vazia e na cabeceira do mundo, o qual enxergas apenas 3/4.  

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Sobre estes dias.

 Por Marcos Araújo              


 Encontrem-na. Necessito de uma bolha hermética para as subjetividades desses tempos de fim, ou recomeço, no entanto, mais tempo de uma longa cadeia de acontecimentos extraordinários e corriqueiros que asfaltam as avenidas periféricas da vida. Tempo que se inicia desde o momento que o mundo ainda parecia uma Caixa de Pandora deveras indefesa e bonita de se contemplar, quando todas as pessoas ao redor eram demasiadamente estranhas e sorridentes, exceto duas delas, separadas do resto do mundo naquele momento: nossos pais.
Ao redor de quase todos, e me refiro a uma maioria, existe uma atmosfera maldosa de profusão de amor, reconhecimento do próximo, bons agouros, corporativismo familiar etc.Tudo isto surge numa fração tão insignificante de tempo que coaduna o seu valor interpessoal de acordo com a duração de sua construção, pois, não me permito deixar de reiterar que isso se chama hipocrisia.
Talvez a minha ressalva com datas comemorativas sejam engendradas de motivos assim, me parece que as pessoas não se importam com a manutenção da máquina motriz de suas vidas quando pensada na ótica e na companhia do outro, mas existem datas para apertar cada parafuso solto ou trocar uma peça enferrujada que faz barulho demais. Ninguém quer ser o que faz o barulho, ninguém quer ser o cerne da crítica da opinião pública, ninguém quer se expor, ninguém que estabelecer a derrocada de um padrão.
Meu valor cabe a quem se percebe e se mostra até um determinado limite, gente que sabe fazer arte com as idéias de um modo que quem a enxergue esteja essencialmente conectado com ela sem perceber. Essa é a arte das palavras, da telas, das músicas, no entanto, é proeminentemente a arte de saber viver com a dignidade de ser o que é e de pensar com a própria cabeça, andando com as próprias pernas e seguindo apenas trilhas as quais foram julgadas como um caminho melhor ou o melhor caminho. Não o que todos querem e fazem por todos terem feito, não o que ninguém quer, ou o que você não quer, mas por alguma razão que não pertence aos optantes, faz, escolhe, prefere e sorri.
Nem todos os Natais são tão Natais para tão belo parecem. Isso pode construir a angústia dentro de um ser humano que está erroneamente inscrito no mundo das frivolidades comemorativas em série, pois, a sua vida, a sua casa, a sua família, sequer a sua árvore é a mesma do seu vizinho. Pode não existir uma casa, uma família ou uma árvore para você, o fato é que sua vida esteve assim o ano todo e você soube eleger correlatamente com outros iguais os dias do fim do ano para imergir num lago gélido de dor. O ano que surge não traz consigo o ensejo de transformação, quem quiser derrubar gigantes com pedrinhas terá primeiro que construir suas barricadas e angariar munição.

"São curtos os limites que separam a resignação da hipocrisia"

Francisco Quevedo


O que entendemos por felicidade, por vezes se confunde com idealizações incontáveis, cheias de ornamentos vazios. Não existe como conter o mundo inteiro na palma das mãos, o homem não pode tabelar o limite da felicidade de qualquer pessoa num calendário colorido pendurado na nossa parede, coordenando nosso sorriso, agendando-o. Sejamos felizes, apenas. O máximo possível, sempre que for possível. Pois, bem diria o nosso poeta: tristeza não tem fim, felicidade sim.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Tributo a Saul Barbosa

No dia 15 de setembro de 2010 a música popular brasileira perdeu Saul Barbosa, compositor e precursor de diversos artistas baianos cujas músicas eram de sua autoria, dentre eles, Daniela Mercury, Asa de Águia, Ivete Sangalo, Márcia Short, Elba Ramalho. Saul sofria de insuficiência renal, além do tratamento que já se prolongava por nove anos, ele mantinha-se ocupado e reafirmava uma das razões de estar vivo com o que lhe dava mais prazer: a música. Após 90 dias de internamento em razão dos problemas de saúde pelos quais lutava, Saul Barbosa faleceu e deixou um legado musical extenso no cenário musical baiano, contando com seus cinco álbuns lançados.
Sob a direção artística de Val Macambira, direção de palco de Nelson Nunes, e a direção musical de Luciano Calazans construiu-se o Tributo que daria destaque à produção musical de Saul Barbosa.A princípio o planejamento apontava que o evento ocorreria no dia 01 de dezembro, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves; contudo, não houve apoio financeiro e institucional para a promoção do evento.Deste modo a saída coube ao adiamento, com previsão para solução dos problemas em questão até o mês de janeiro.Dentre os músicos cotados para participar do tributo estavam Elba Ramalho, Margareth Menezes, Jammil, Márcia Short, Gerônimo, Ricardo Chaves, Carla Cristina, Roberto Mendes, Val Macambira, Jorge Portugal, Laurinha e Zelito Val Macambira.
Com uma ligeira alteração na lista de participações confirmadas, o Tributo que seria introduzido pela companhia de dança de Nena Barbosa, filha de Saul, o evento ocorreu no dia 19 de dezembro no Parque da Cidade.A entrada era garantida mediante a doação de 1kg de alimento não perecível cujo destino cabia a creches e instituições de caridade.Com a exceção da banda Jamil, que não compareceria mais , foi confirmado a presença de Adelmo Casé, Jatobá, Xangai e Jau.
As problemáticas para a construção da homenagem dedicada a Saul Barbosa não se limitaram a falta de apoios. O Corpo de Baile, grupo de dança que faria a abertura do tributo não se apresentou, em seguida Val Macambira trouxe para ao público outra notícia desconfortante para os que estavam ávidos pela celebração da música de Saul, Margareth Menezes e Elba Ramalho não iriam mais participar, pois, haviam perdido o vôo. Jau não apareceu, ninguém viu Ricardo Chaves, Adelmo Casé também não marcou presença. De todo modo, os demais artistas proporcionaram boa música e alegria para os espectadores que se agitaram com os imprevistos desagradáveis.
O tributo durou uma hora e meia, com destaque para as apresentações de Tonho Matéria, Márcia Short. Gerônimo e Carla Cristina. O público interagiu com a música de Saul, dançou, pediu bis e no final, quando todos os artistas participantes reuniram-se para cantar “Menino do Pelô”, inconformados com a ausência dos outros artistas, o clima de descontração encerrou-se em vaias da platéia e constrangimento. As pessoas protestaram contra uma suposta falta de compromisso dos músicos que não compareceram, por isso, o evento que já não havia iniciado com plenitude, encerrou-se de um modo potencialmente constrangedor. Salve a música popular brasileira, salve Saul Barbosa, mas numa hora dessas qualquer homenageado se rebateria no túmulo com tamanha confusão.


Por Marcos Araújo


terça-feira, 14 de dezembro de 2010


Eu quero um pedaço de você, sem lesá-lo, sem imputar seqüelas a teu corpo tão bem quisto por mim. Ontem sonhava bobo, voávamos num balão listrado, simples, raso, e lá de cima, reunimo-nos num espaço livre e comum de múltiplas cores, vimos a Terra na sua mais magnífica estação de paz. Sobre os homens voavam as aves e o brilho das árvores é que nos fazia cantar, nossa voz atravessava o céu, encurtava os raios de sol a se perder na brisa que soprava. Tão linda era a luz resguardando aquela imensidão conturbada, pois, alguns metros abaixo de nossos pés, nos arranha-céus de São Paulo; nos escritórios; nos arredores da Praça da Sé; nos bancos; nas filas; nos bosques escamoteando com flores a grandeza da solidão, habitava o caos incomum nas alturas.
Se mais tarde o céu não nos engolisse já desfalecidos pela fome e sede, se mais tarde a biologia não nos enquadrasse como todos os outros lá embaixo no leito de morte, se a felicidade pudesse suprir por todo o sempre nosso gozo vívido e pleno de tudo o que nos torna humanos, passaríamos toda vida aqui no alto, vibrando pelo mundo de um modo tão impetuoso que nossos corações tornar-se-iam de comum uso, pois, eu e você somos como um acordo de amor tácito e eminentemente despojado de obrigações carcerárias, nós somos livres para amar o mundo, as coisas e um ao outro. Aterrisso leve junto às folhas da primavera a flutuar e volto para casa sustentando-te nos braços meus, para nosso lugarejo banhado de luz retorno contigo, desta vez mais feliz, em nossas paredes há de se construir estrelas cadentes a perpetuar o desejo de amarmo-nos todo o sempre, com cada pedaço que apenas dois meninos poderiam colher do azul sereno e infinito do infinito dos céus.

Por Marcos Araújo

sábado, 11 de dezembro de 2010

Pedaço

Senhor, sei que não tenho agradado e por um acaso perpasso o temor, com a pele em chamas, sem pensar na alvorada a iluminar meu amor. Senhor, por mais bela que seja a serra e sua fauna feita à mão, teu coração legítimo e intocável que contém a Terra, por mais alva que seja a esfera de sua imensidão, oh pai, não tens me dado a paz que contempla o ser amado.

Algo atormenta minha casa parada sobre teu pasto azul, por favor, por favor, ergue tuas mãos sobre o dia que surge, leva o ar pesado que a contém, se esvai, e sai levando a dor.Senhor, me faz do outro esquecer, faz da avareza um taciturno resguardado em solidão e não um acaso, um ser errante odiável, não faz de mim um miserável a padecer na escuridão.

Eu, senhor, sou ao contrário, sou meu avesso, inimigo de mim. Mas de quem eu não tenho o apreço, saiba logo, sem atraso, saiba que há espaço para cada um dentro do meu peito, pois, tudo o que vejo  e o que sinto e que toca meus lábios, o que acolho nos braços é o que me faz feliz assim.Do meu modo sou fera, a fenda, presa e caçador, senhor de mim.

Por Marcos Araújo.

sábado, 4 de dezembro de 2010

O inferno é o que os outros fazem de você.

Aplicabilidade é uma palavra um tanto confusa para definir o que os grandes pensadores da antiguidade; modernos; contemporâneos; elucidariam quanto aos fatos sociais contidos hodiernamente, não é raro encontrar teorias, assertivas, ensaios, conjecturas, pluralmente adequáveis ao nível da experiência humana construída por nós, a eterna nova geração de rotatividades singulares. Dentre os pensadores, note-se o destaque concebido, devido antes de tudo por uma predileção literária, que recairá aos que se ocuparam em perquirir o universo filosófico, metafísico, ontológico etc.
O existencialismo traz consigo um papel deveras importante nessa alçada, em especial os méritos abordados por Sartre. Este último considerou a experiência da vida humana calcada a princípio em dois postulados que consentia a existência de apenas dois tipos de seres no mundo: seres em si correspondem a tudo aquilo que não tem consciência de si mesmo enquanto ente, além de ter sua essência pré-concebida por alguém que construiria o sentido de sua existência; seres para si correspondem ao ser humano, a existência oriunda do vácuo, do escuro, do nada, aquele que ninguém criou e que não sabe a que veio, nem para que ou para quem deva servir, esse é o homem.

- Conheça a vida e obra de Sartre: 



A existência do homem pende a sucessiva construção de sua essência, que não pode ser comprada ou negociada, no entanto, sua mutabilidade se estende tanto para o presente, quanto para o futuro, pois, tudo o que ele fez e que repercutiu na vida de todos que os cercam/cercaram, jamais poderá ser alterado por qualquer motivo, o que foi feito, sempre estará feito. Todavia, devo reiterar, Sartre considera a possibilidade de cada pessoa transformar sua realidade de acordo com o caminho que ela considera ser o certo para trilhar.
 Para o existencialismo sartriano nós somos eminentemente livres, estamos condenados a uma liberdade cruel que imputa para o ser humano a obrigatoriedade de fazer escolhas, são as escolhas que fornecem o sopro vital para a continuidade de sua existência, para o sustento pleno do eterno construir de sua essência, pois, por seu turno, a essência nada mais é do que o apanhado das diversas subjetividades que fazem do homem, homem, e não cadeira, copo, poste. Ademais, o homem não é despojado de qualquer responsabilidade por estar naturalmente munido de tanta liberdade, tudo o que ele faz reflete no social e gera as devidas conseqüências, independente de como ela se apresente, isso o torna um ser angustiado e constantemente confuso.
A teoria da má fé erige-se com um mecanismo de defesa, de construção de identidade e de válvula de escape para suportar essa condição eterna de “vir a ser” em que nos inserimos, pois, é um modo que o homem encontrou de dizer a si mesmo que ele é o papel que representa, o que é a vida senão um palco?Estamos professores, alunos, petistas, ativistas, criminosos, não somos, nunca somos, nunca seremos, um objeto é, nós, jamais. Aqueles que “são” ao invés de “estar”, se utilizam desse mecanismo de defesa e se tornam coisas por assim se definir.


"O homem não é a soma do que tem, mas a totalidade do que ainda não tem, do que poderia ter"
Jean-Paul Sartre 


Talvez o conceito mais notável e mais importante advindo do existencialismo de Sartre seja o que considera o homem como ser para-si, apenas quando está em contato com outros iguais, pois que a construção de sua essência pende a presença do outro, que por sua vez terá hábitos, costumes, objetivos e desejos diferenciados. É a partir do outro que o homem pode enxergar-se como tal e inserir-se socialmente como amigo ou concorrente, uma vez que temos interesses e planos que podem entrechocar-se por muitas vezes nas mais diversas circunstâncias.
Um dos problemas econômicos mais pertinentes assinala justamente uma característica humana que mantém uma relação bastante estreita com a máxima anterior, não se pode produzir tudo devido a perpétua insatisfação humana, não há como produzir infinitas variáveis com recursos escassos, porém isso não recai sobre o entendimento do ser racional, mais e mais e mais é o que queremos(sem exceções).
Ao observar o outro, o ser humano tende a impulsionar a formação de sua essência de acordo com o que ele percebe no ambiente em que está inserido, ordinariamente o seu crescimento perpassa o desejo particular e salta para o prestígio social ou para a superação do outro que se movimenta ao redor, essa construção parece mais intensa, pois existe um espírito de competitividade muito rigoroso nessa corrida tácita e dolorosa, portanto, a angústia de existir e o discurso de “ser alguém” calcado no padrão alheio, é o que torna a sua existência cada vez mais atribulada.
Conscientemente ou não, perceber no outro a falência que ele não quer pra si, o revigora a ponto de enaltecê-lo por existir alguém em condições mais precárias do que as quais que ele se encontra. O incentivo para tomar conta de sua realidade ou o cerne de sua apraxia encerra-se no progresso, no bem estar, na competência do outro. Assevera-se o fato de que cada homem é dono do próprio destino, descarta-se do discurso de Sartre qualquer alusão que se aproxime do determinismo ou do darwinismo social.  
Segundo Sartre “o inferno são os outros”; contudo, desconsideraria a abrangência homogeneizante dessa afirmativa para considerar peculiaridades percebidas na experiência humana do dia-a-dia.O inferno é o que os outros fazem de você, talvez não perceba, mas os movimentos que fazemos ao longo de nossa vida não justificam o nosso afastamento completo de um estado de inépcia; todavia, assinala que nossa disputa, nossa corrida, nossos desejos e tudo que dele derive, condiciona-se potencialmente nos que enxergamos no outro, aquele que o ser humano tenta ser ao invés de olhar para si nem que seja por alguns instantes.

Por Marcos Araújo